Imagino David e Nick, os dois remanescentes do Pink Floyd conversando…
– Nick, precisamos de um último álbum;
– Mas não temos nada gravado, David!
– E aquele monte de sons que gravamos pra passar tempo?
– Hummm… é mesmo!
É por aí. O Novo e último CD do Pink Floyd é um monte de som instrumental, só tem uma música com letra. A parte boa é que é o Pink Floyd como em 1969, entre a psicodelia e o progressivo.
Um ótimo CD para som de fundo para alguma atividade, lounge, tals. São três institutos em um mesmo CD: Um tributo ao tecladista morto, Rock Wright, sobras de gravação do “Division Bell” e ´de quebra´, um novo lançamento.
Acho difícil acreditar que esse seja o último CD da banda (desde que Ozzy, o Osbourne, disse ao mundo que se aposentaria em 1993 e cinco anos depois voltou à ativa que nunca mais acredito nesses lances de “despedida”), até dá pra engolir que seja o último “oficial”, não porque os dois únicos integrantes remanescentes (pós-1985, sem contar o Roger Waters, portanto) estejam envelhecendo, mas porque simplesmente estão morrendo – o teclado de Richard Wright, penso, era como a bateria de John Bohan para o Led Zeppelin, deixa um vazio tão grande que não dá para seguir adiante sem ele. O que deva vir daqui para frente são sobras e bootlegs.
Vamos à audição: A princípio, de cara, eu não havia gostado; aí comecei a escutar e fui gostando – acho que demoramos pra entrar “no clima” do disco. O que parece um disco de restos, começa a ter vida própria. É bem verdade que as músicas não tem conexão alguma.
Assim como Bob Dylan e Jimmy Hendrix provaram que não precisa ter voz bonita pra cantar, David Gilmour prova que não precisa tocar guitarra rápido para ser exímio guitarrista.
Um pouco sobre as músicas:
A “Eyes do Pearl” é apenas um emaranhado baixinho de efeitos para se entrar na onda do disco, não sendo uma “música” propriamente, tem a mesma função que a “Speak to Me” no disco “Dark Side of the Moon”; e a “Night Light” soa como um experimento de Rick Wright para gerar algum som criativo dos sintetizadores – nota-se que ele brinca com o efeito de oscilador no som de umas teclas – alguém (Nick e/ou Gilmour) gostou(aram) e resolveram chapar no disco, talvez por certeza de que não haveria alguma futura oportunidade para isso;
A “Autumn´68” , “Calling”, “Unsumg” , “The Lost Art Of Conversation” e “Things Left Unsaid” mais parecem vinhetas, que foram excluídas da edição final do Dvision Bell, e só fazem sentido serem escutadas caso se ouça o CD por inteiro.
A “Allons-Y(1)” vale pelo solo eletrizante. A “Allons-Y(2)” é, sem tirar nem por, uma simples continuação da “(1)”, não sabendo eu o motivo de ela haver sido separada desta.
“Surfacing”, “Sum” e “It´s What We Do” são músicas instrumentais curtas relaxantes, viagem, úteis para se deixar tocando como música-ambiente, ou para se deixar o pensamento agando.
“Talkin´Hawkin´” é a música instrumental mais legal do disco, a segunda melhor música do álbum. Além do tema ser convincente, ainda tem a voz incidental de Stephen Hawking ao fundo lá pela metade da música.
“Skins” traz a bateria de Nick Mason como destaque, nos moldes do “One of These Days” como tocada no “Live At Pompeii”, mas termina em um anticlimax quase silêncio obscuro;
“Ebb and Flow”, que termina com quase meio minuto de silêncio, acho que só foi incluída como homenagem a Rick Wright, é a própria “não-o-que-é-isso” do disco;
“On Noodle Street” é claramente uma jam descompromissada dos três integrantes da banda, tocada no início do ensaio para equalizar e timbrar os instrumentos, ou alguma tentativa de comporem algo a partir de um insight de improviso – do jeito que saiu resolveram gravar e, também para homenagear Rick, tascaram no CD (é o que me pareceu escutando a faixa);
“Anisina” é a terceira melhor música do disco, uma instrumental que indica que a banda estava empolgada quando gravou, impossível não pensarmos em “Us and Them” do “Darl Side Of The Moon” quando a escutamos, o clima é bem parecido, até o sax está lá;
“Louder Tran Words” é a melhor música do CD. É uma musica ótima, maravilhosa, sob qualquer aspecto que se considere. A melodia-harmonia-ritmo e letra estão com precisão celestial. Não seria um exagero afirmar que o disco inteiro é uma preparação para a aparição desta faixa. Como diria um primo meu, Marcelo: “Essa música vale o disco!”. A letra tanto pode ser interpretada como uma conversa de um casal, como uma declaração da banda sobre o entrosamento dos membros ao ponto de se entenderem sem precisar de palavras (acho que isso não incluía Roger Waters, claro). Se esse for realmente o último disco de estúdio do Pink Floyd, fecha dignamente os quase 40 anos de banda com maestria.
Ela pode ser ouvida no youtube, aqui:
O disco tem o mesmo problema do Código Civil Brasileiro: já nasce velho. O Código Civil foi publicado em 2002, mas foi escrito entre 1969 e 1976. Esse disco do PF, agora lançado, foi gravado em 1993, só há 21 anos.
Somos portanto testemunha da história, vivendo o momento em que é lançado o último disco do PF.
Achei o andamento e clima geral parecido com “Cymbaline”, uma música do PF do início da carreira. Como disseram Paulo Coelho e Raul Seixas na letra de “Meu amigo Pedro”: “Tudo acaba onde começou”.