Sou fã do Toddynho! Nos anos 80 (costumo escrever sobre essa década aos domingos), haviam dois achocolatados, o Mocoquinha e o Toddynho. O Toddynho surgiu em 82/83 com o nome de “Toddy Pronto”, mudando de nome logo depois.
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Tudo sempre esteve bem, quando me deparo com a notícia de que embalagens do Toddynho continham água sanitária e solução de limpeza de tanques da fábrica. Enquanto escrevo este post, já são 37 vítimas.
Como isso se enquadra no Código de Defesa do Consumidor (CDC)? Bem, chama-se “Fato do Produto”.
Segundo o CDC, são basicamente duas ocorrências ligadas diretamente ao produto (outras ocorrências existem, mas ligaras aos atos do fornecedor!), que geram dano. Quando atinge o consumidor, chama-se “fato”, e quando atinge sua expectativa, chama-se “vício”.
Em sala de aula, costumo dizer que “fato é sangue, vício é raiva”; como também escrevi no meu livro.
Ok, como o CDC trata o fato, então? Tenho duas notícias, a boa e a ruim.
A boa notícia é que o fato é previsto no CDC, e o fornecedor responde de forma objetiva, ou seja, não se discute em juízo se a fábrica, neste caso, teve ou não culpa pelos danos:
Art. 12. O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos.(…)
Art. 27. Prescreve em cinco anos a pretensão à reparação pelos danos causados por fato do produto ou do serviço prevista na Seção II deste Capítulo, iniciando-se a contagem do prazo a partir do conhecimento do dano e de sua autoria.
A má notícia é que a responsabilização civil (RC) ao consumidor (seja indenização ou compensação) não é regulada pelo CDC, sendo gerenciada pelo Código Civil (CCB), Processo Civil e Lei dos Juizados Especiais. Para ficar só no CCB:
Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.
Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.
Art. 402. Salvo as exceções expressamente previstas em lei, as perdas e danos devidas ao credor abrangem, além do que ele efetivamente perdeu, o que razoavelmente deixou de lucrar.
(nesta ordem, tratei desses três artigos no meu livro de Direito Civil, chamei-o de “Triângulo de RC”) Sobre Vício do Produto, já tratei anteriormente, aqui no blog.
Os outros artigos do CDC pertinentes à ocorrência:
A PepsiCo atentou contra a saúde dos bebedores de Toddy, detonando o CDC logo no início: Art. 6º São direitos básicos do consumidor:I – a proteção da vida, saúde e segurança contra os riscos provocados por práticas no fornecimento de produtos e serviços considerados perigosos ou nocivos;
(…)
VI – a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos;
(…)
O Artigo 10 do CDC trata do Recall que, pelo que li, a empresa já está realizando (ainda bem!):
Art. 10. O fornecedor não poderá colocar no mercado de consumo produto ou serviço que sabe ou deveria saber apresentar alto grau de nocividade ou periculosidade à saúde ou segurança.§ 1° O fornecedor de produtos e serviços que, posteriormente à sua introdução no mercado de consumo, tiver conhecimento da periculosidade que apresentem, deverá comunicar o fato imediatamente às autoridades competentes e aos consumidores, mediante anúncios publicitários.
(…)
O artigo 101 do CDC ainda nos diz que as ações de reparação de dano podem ser ajuizadas nos domicílios das vítimas, e podem requerer tal reparação não apenas estas, mas um rol que está previsto no próprio CDC: o Ministério Público, a União, os Estados, os Municípios e o Distrito Federal; as entidades e órgãos da Administração Pública destinados à defesa dos interesses dos consumidores, e as associações legalmente constituídas há pelo menos um ano (que, em alguns casos, podem ter tal tempo mínimo dispensado).
Ao que consta nas revistas, a PepsiCo não foi transparente; não avisou logo (só avisou depois de muito pressionada e investigada por repórteres) o ocorrido. Isso afronta alguns outros dispositivos do CDC:
Art. 8° Os produtos e serviços colocados no mercado de consumo não acarretarão riscos à saúde ou segurança dos consumidores, exceto os considerados normais e previsíveis em decorrência de sua natureza e fruição, obrigando-se os fornecedores, em qualquer hipótese, a dar as informações necessárias e adequadas a seu respeito.
Os crimes do CDC não pegaram, na prática; são de menor potencial ofensivo mas, tecnicamente, houve o crime do artigo 64 com uma agravante:
Art. 64. Deixar de comunicar à autoridade competente e aos consumidores a nocividade ou periculosidade de produtos cujo conhecimento seja posterior à sua colocação no mercado:
Pena – Detenção de seis meses a dois anos e multa.
Parágrafo único. Incorrerá nas mesmas penas quem deixar de retirar do mercado, imediatamente quando determinado pela autoridade competente, os produtos nocivos ou perigosos, na forma deste artigo.
(…)
Art. 76. São circunstâncias agravantes dos crimes tipificados neste código:
II – ocasionarem grave dano individual ou coletivo;
(…)
Um dia escrevo sobre a postura do Poder Público perante esse fato.
Bem, acho que vou voltar a beber Toddynho, mas agora com cuidado. E, se estiver com gosto de detergente, não perdi dinheiro, dá pra usar na esponja de lavar pratos, quando acabar o Limpol. (Vejo vantagem em tudo!)
Art. 64. Deixar de comunicar à autoridade competente e aos consumidores a nocividade ou periculosidade de produtos cujo conhecimento seja posterior à sua colocação no mercado:
Pena – Detenção de seis meses a dois anos e multa.
Em caso de pessoa juridica a quem se aplica essa detenção de seis meses?
Os únicos dois casos onde há responsabilidade PENAL para a pessoa jurídica, no Brasil são: Crimes ambientais e e Crimes contra a economia popular.
Neste casos, do CDC, a pena é pessoal e imponível ao autor (pessoa física! administrador/supervisor/responsável; podendo haver concurso de pessoas) da conduta omissiva; não há vedação a tão imputação.